Travessias. De fato, elas nos compõem — no cotidiano, nas relações, nos emaranhados da vida. Guimarães Rosa nos lembra que "quem elegeu a busca não pode recusar a travessia". Aqui, pressupõe-se a implicação da dor. Todavia, este não é um texto sobre as nossas angústias, mas poderia ser. Chimamanda Adichie, autora africana, escreve sobre o perigo em enxergarmos uma narrativa única sobre as nossas histórias. Um momento de travessia não precisa, necessariamente, significar um momento de dor. Comecei a brincar de dividir as travessias mais ou menos assim: necessárias, difíceis ou serenas. Eu tenho um apreço por essa última possibilidade, porque, na maioria das vezes, ela passa despercebida. Habituamo-nos a enxergar importantes lições somente após intempéries. Mas, miudezas também nos impactam. Cora Carolina, poeta brasileira, disse que "se crescemos com os golpes duros da vida, também podemos crescer com os toques suaves". Talvez, para notar os aprendizados serenos, seja necessário mudar a forma de olhar. Quando permitimo-nos isso, os momentos cotidianos nos fornecem pistas de narrativas alternativas para as nossas pequenas-importantes travessias. Num dia desses difíceis, um amigo enviou-me uma canção que dizia "existem outras histórias na sua história". Nomeei esse pequeno acontecimento de "a resposta mais bonita do dia". Talvez, esse texto seja um convite para repararmos nas respostas bonitas também. Nos esperançarmos em nossas travessias. Existe poesia na esperança.
Ana Cláudia Loureiro
CRP: 14/07125-4
Fotografia: Rebeca Moreira