Em 2020, a nossa televisão brasileira de cada dia, completa 70 anos. Essa história contém momentos ímpares, principalmente na teledramaturgia, seu gênero de maior sucesso até hoje.
Numa dessas ocasiões, belíssimas e extasiantes paisagens da fauna e flora sul-mato-grossenses, recheadas de muita ousadia e captadas sob um olhar cinematográfico, catalizaram o Brasil.
Há exatos 30 anos, em 27 de março de 1990, a Rede Manchete de Televisão, estreava seu produto de maior sucesso, a novela "Pantanal".
Escrita por Benedito Ruy Barbosa, o folhetim foi um sonho do autor que a Globo preferiu não consumar. Desde meados dos anos 80, ele apresentou inúmeras vezes o projeto a direção da emissora, ao qual a considerou financeira e logisticamente inviável.
Acreditando no potencial de sua história (idealizada após uma passagem de Benedito por MS), ele aceita a proposta da dramaturgia da Manchete, sob direção de Jayme Monjardim, e transfere-se para a televisão dos Bloch's.
Com milhões de dólares investidos, Adolpho Bloch (1908-1995) apostou alto na produção, levando o país desfrutar de um lugar, até então, pouco retratado na televisão. Entre a metrópole carioca e as matas, rios, peixes, bois e cavalos do Mato Grosso do Sul, transitava uma trama emocionante, exuberante e cativante, onde José Leôncio, Juma, Jove, Tadeu, Guta, Filó, Irma, Maria Bruaca, Tenório, Muda, Terêncio, Tibério e companhia, viviam seus dramas e conflitos. Elementos esses, suficientes para transformá-la numa das telenovelas de maior sucesso da TV e das poucas a abalar o império global.
Não unicamente pelas múltiplas cenas sensuais, sua eficácia em seduzir o público, converteu-se em médias impressionantes (mais de 40 pontos), colocando a Manchete na liderança no horário nobre e ultrapassando atrações consagradas da linha de shows da Globo à época, como "Chico Anysio Show" e "TV Pirata".
Assim, a guerra entre as duas emissoras foi um marco, a ponto de fazer a TV Globo, acostumada a ser soberana, esticar sua novela das oito (Rainha da Sucata) até às 21h30, horário de Pantanal e criar outra novela (Araponga) para frear a concorrente, resultando em táticas sem sucesso.
Gravada nos estúdios da Manchete em Água Grande (Rio) e na Fazenda Rio Negro, em Aquidauana/MS, a produção teve apoio logistico da TV MS (hoje Record) afiliada da Manchete, mobilizando diversos profissionais que enfrentaram muitas dificuldades operacionais, de comunicação e produção.
As participações do cantor sul-mato-grossense Almir Sater e Sérgio Reis, foram um deleite a boa música sertaneja e um dos pontos altos da trama, com suas cantorias pelas noites que movimentavam a fazenda e o coração do telespectador.
Atuações marcantes de Claudio Marzo (1940-2015), Jussara Freire, Paulo Gorgulho, Marcos Palmeira, e alçando a categoria de estrelas de TV, Marcos Winter e a estreante Cristiana Oliveira, como a icônica "mulher onça", Juma Marruá.
Mesmo mergulhada numa grave crise, 1990 foi o melhor ano na história da Manchete em audiência e lucro (U$$ 120 milhões), nos 16 que esteve no ar.
Uma coisa é certa: a Globo ERROU em recusar o roteiro e arrependeu-se amargamente de não tê-la produzido. Sem dúvida, seria uma exitosa novela das oito.
Pantanal, mais que uma produção televisiva, é sinônimo de garra, determinação, talento, contemplação, afirmação cultural de um estado e, sobretudo, da valorização e preservação a natureza, infelizmente tão atacada pela irracionalidade do homem.