Polícia lista suspeitos e defende linha dura contra black blocs
Em uma tentativa de enfraquecer os protestos de grupos black blocs marcados para esta sexta-feira, a polícia paulista interrogou, listou e fotografou 65 dos 280 suspeitos detidos após participar de ações violentas dura
Em uma tentativa de enfraquecer os protestos de grupos black blocs marcados para esta sexta-feira, a polícia paulista interrogou, listou e fotografou 65 dos 280 suspeitos detidos após participar de ações violentas durante manifestações no Estado nos últimos meses.
A polícia sugeriu ainda que os black blocks passem a ser tratados da mesma forma que os torcedores de futebol brigões: eles seriam obrigados a comparecer a delegacias duas horas antes de cada protesto e deixariam o local só duas horas após a manifestação.
Os advogados de parte dos suspeitos interrogados na quinta-feira negaram que seus clientes fizessem parte do grupo Black Block e disseram que suas detenções foram ilegais ou de caráter político.
A Polícia Civil de São Paulo diz que trabalhava com relatórios de inteligência segundo os quais grupos black blocs preparavam grandes manifestações em todo o Brasil nesta sexta-feira. Elas ocorreriam a partir do meio da tarde.
A maioria das ações estaria sendo planejada pela internet e seria organizada por lideranças que atuariam em diferentes Estados simultaneamente, segundo a polícia. Os adeptos do Black Bloc afirmam em páginas da internet que o termo designa uma tática de confronto e não um grupo específico.
Os interrogatórios de suspeitos ocorridos na quinta-feira já estavam previstos como parte de um inquérito do Deic (Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado), que unifica todas as investigações sobre o grupo no Estado aberto há cerca de um mês. Todos os ouvidos foram liberados após responderem às perguntas da polícia.
Porém, policiais que não se identificaram disseram à BBC Brasil que os interrogatórios podem dissuadir parte dos supostos black blocs de atender a uma convocação para protestos na tarde desta sexta-feira pela por meio da internet.
Segundo o diretor do Deic (Departamento de Investigações sobre o Crime Organizado), Wagner Giudice, o grupo interrogado é heterogêneo e tem tanto membros ativos do Black Bloc como simpatizantes do movimento detidos ocasionalmente em protestos anteriores.
A maioria dos interrogados têm idades entre 16 e 25 anos (nove dos 65 são menores de idade), é de classe média e parte estuda. Um grupo com cerca de 15 suspeitos era formado majoritariamente por universitários de faculdades de ciências humanas da USP, a Universidade de São Paulo.
"Já identificamos as lideranças, mas há muitos que só atenderam uma convocação, são inocentes alienados via redes sociais", disse Giudice.
"Eu vi muita gente chorando (nos interrogatórios) com a mãe do lado e levando bronca dela", disse Giudice.
O delegado disse porém que muitos interrogados apontaram a participação de partidos políticos na organização dos protestos. Ele não disse quais são as legendas, mas a BBC apurou que a suspeita da polícia é de que membros de partidos de extrema esquerda estejam ligados aos black blocs em São Paulo.
Giudice afirmou que houve um entendimento na força-tarefa formada pela polícia e pelo Ministério Público para investigar os black blocs de que eles devem ser indiciados pelo crime de associação criminosa (a antiga formação de quadrilha).
Até então não havia um consenso completo na polícia paulista, e cada delegado indiciava suspeitos por crimes diferentes. Ao adotar o novo procedimento, São Paulo segue uma fórmula que já vinha sendo aplicada no Rio de Janeiro.
A tese é a de que os suspeitos se reuniriam de forma organizada e reiterada para cometer crimes, na maioria das vezes o dano ao patrimônio durante os protestos. Na prática, isso significa que uma vez detidos, esses suspeitos podem ser presos em flagrante e receber penas de até três anos de prisão.
A opção de indiciamento por associação criminosa é considerada por analistas uma resposta dura aos manifestantes. Partidários de tratamento mais leve aos suspeitos defendem que eles respondam por crimes como o dano, que tem penas mais leves e permite que a pessoa responda às acusações em liberdade.
Giudice afirmou que os interrogatórios vão continuar. Cerca de 80 suspeitos haviam sido chamados a depor na quinta-feira. Os 15 que faltaram devem ser reconvocados para depor em outro dia. Além disso, cerca de outras 200 pessoas ainda podem ser ouvidas nos próximos dias.
Giudice disse que apesar de todos os integrantes da primeira leva de interrogatórios serem liberados após as oitivas, parte pode ser indiciada no decorrer da investigação.
Ele também sugeriu que uma vez identificados, os black blocs sejam tratados como torcedores de futebol que se envolvem frequentemente em brigas de torcidas. Uma vez que a polícia identificasse protestos sendo convocados, esses suspeitos seriam convocados a comparecer em delegacias. Lá permaneceriam durante todo o protesto.
Contudo, a implementação de medida como essa dependeria de aprovação do Judiciário.
O advogado Geraldo Santamaria Neto, que defende dois dos suspeitos – presos durante um protesto na Marginal Pinheiros no mês passado – disse que as detenções deles na ocasião foram ilegais.
"Não são black blocs, eles estavam apenas se manifestando", disse. Um dos clientes dele foi detido após invadir a loja Tok&Stok.
Já o advogado Alberto Albiero, da central sindical CSP Conlutas, defende 15 suspeitos, todos estudantes da USP.
Eles foram detidos no mesmo protesto da Marginal Pinheiros. "Nenhum deles é black bloc. Isso não nos parece correto, era um ato pacífico. Foram presos ilegalmente, trata-se de perseguição política", disse. Ele afirmou que parte de seus clientes seria vinculada aos partidos PSOL e PSTU.
"Eu vim depor e perguntaram se eu era black bloc, mas não sou", disse um rapaz logo após ser liberado por policiais do Deic.
Já outro interrogado, Alexandre Morgado, de 30 anos, disse que pertence ao Grupo de Apoio ao Protesto Popular (Gapp), uma equipe de 11 socorristas que atende tanto manifestantes quanto policiais feridos durante os protestos.
"Nós fazemos o atendimento (de primeiros socorros) no local e esperamos com a vítima até a chegada do Samu (o serviço de ambulâncias da prefeitura)", disse.
Morgado afirmou que ele e seu grupo não são black blocs, até porque atuam sem máscaras. Ele diz ter sido detido enquanto dava atendimento a um ferido.
Já a polícia diz que o Gapp é um grupo black bloc investigado por fornecer uma estrutura de apoio médico aos manifestantes violentos para evitar que, uma vez feridos, eles deem entrada em hospitais e assim sejam identificados pela inteligência policial.
BBC Brasil