TRUMPISMO
Ídolo de Bolsonaro, Trump deixará o cargo com rastro de caos e pendências
Trump foi um dos líderes mais agressivos e talvez o mais antidemocrático a ocupar a Casa Branca
A Presidência mais conturbada dos EUA em décadas chega ao fim ao meio-dia (14h de Brasília) da próxima 4ª-feira (20.jan.21), quando o ídolo de Jair Bolsonaro, ainda presidente americano Donald Trump, verá empossarem o vitorioso democrata Joe Biden. Mas Donald Trump seguirá tentando chamar a atenção para se manter em destaque na política americana, na direção contrária do que fizeram outros ex-presidentes do país.
Trump foi um dos líderes mais agressivos –e talvez o mais antidemocrático– a ocupar a Casa Branca. Ele, que sempre buscou o confronto em vez da conciliação, estava perto de entregar um país já dividido e duramente atingido pela pandemia. Mas seu legado ganhou uma mancha ainda maior em seus últimos dias no cargo, ao estimular uma insurreição contra o Congresso.
Como resultado, Trump foi banido de redes sociais e teve o segundo processo de impeachment aprovado na Câmara dos Deputados – agora, com o apoio de dez republicanos, um sinal de que o partido está rachado. Por outro lado, 197 correligionários votaram contra a ação, e muitos deles fizeram discursos fervorosos em defesa do presidente.
A decisão sobre afastá-lo e, mais importante, fazer com que perca direitos políticos, tirando a possibilidade de que concorra outra vez à Presidência, caberá, mais do que ao Senado, ao Partido Republicano. São necessários 67 votos para condenar Trump, e os democratas terão apenas 50 quando o processo for julgado na Casa.
"A principal questão é saber como o Partido Republicano resolverá suas disputas internas. Se o establishment vai se impor, ou se a legenda continuará dependente do trumpismo", avalia Sérgio Amaral, ex-embaixador do Brasil em Washington (e pesquisador do Cebri (Centro Brasileiro de Relações Internacionais).
Trump conseguiu manter sua aprovação relativamente estável ao longo do governo, oscilando em torno de 40%, com uma mistura de estratégias novas e antigas. De um lado, buscou cumprir promessas de campanha, como restringir a imigração, criar empregos e defender pautas conservadoras –o maior acesso ao porte de armas e a proibição ao aborto, por exemplo.
De outro, manteve um clima de tensão constante, com rivais sendo colocados como inimigos mortais, além de negar os riscos do aquecimento global e da pandemia de coronavírus, muitas vezes com base em mentiras e em teorias estapafúrdias.
BOLSONARO TAMBÉM FOI DERROTADO
Jair Bolsonaro apostou no cavalo perdedor. Depois, passou a apoiar o jóquei que chegou em segundo e esperneava, sem provas, que o vencedor dopou o cavalo, sabotou a pista, subornou os juízes e corrompeu o público. O pior de tudo é que o presidente brasileiro fez a aposta com o dinheiro dos brasileiros. A metáfora aqui, apresentada pelo jornalista Leonardo Sakamoto, em 8 de novembro de 2020, ilustra o desespero que hoje levou Bolsonaro a reativar suposto gabinete do ódio no planalto. Trata-se de uma equipe de assessores bolsonaristas que trabalham enviando mensagens extremistas de direita à eleitores bolsonaristas para continuar a alimentá-los com mentiras no WhatsApp, de modo a não perder os seguidores.
O sintoma da derrota de Trump, que tem seu legado final na 4ª-feira que vem, será sentido ainda mais por Bolsonaro devido a vitória do tucano João Dória (PSDB), que conseguiu iniciar a vacinação contra a Covid-19, 24h antes que os estados submissos aos desmandos bolsonaristas, que perdidos, com um chefe de pasta sem conhecimento médico, tenta sobreviver em meio a notícia de milhares de obitos registrados todos os dias no Brasil.
E no dia em que o Brasil passou a ter oficialmente uma vacina, foram registrados 518 óbitos, elevando o total a 209.868, com média móvel de mortes nos últimos sete dias em 961, o que indica crescimento.
"Brasil deixou de aderir inicialmente a uma coalizão global pelas vacinas em abril, que daria prioridade aos brasileiros com vacinas. Optou por uma política que minava a confiança na Coronavac e investiu num pacote negacionista que explica o colapso de Manaus e a dor de milhares de famílias", destacou o El País, nesta 2ª-feira (18.jan).
"Aqui jaz os restos conceituais da política externa do governo de Jair Bolsonaro, responsável por isolar o país do grupo das grandes democracias do mundo e destruir a reputação de uma nação. Na lápide da diplomacia do Brasil, essa bem poderia ser a descrição para quem um dia for visitar o memorial dedicado às ideias, projetos e políticas que não sobreviveram à pandemia", reforçou o El País.
FONTE: FolhaPress