O que não faltou na eleição para a Mesa Diretora do Senado Federal foi a praxe da infidelidade ao voto prometido ou acordado em resolução de âmbito partidário ou mesmo de bancada. E um dos protagonistas dessa tão malsinada prática na política é um senador do PSD de Mato Grosso do Sul, Nelsinho Trad.
Em menor número que nas disputas anteriores, a traição, como atitude individual, voltou a surpreender e chocou quem confiava na obediência dos senadores às decisões partidárias que oficializaram de apoio a um dos dois concorrentes, o pessedista mineiro Rodrigo Pacheco e o capixaba Rogério Marinho, do PL. Pacheco venceu com alguma folga (49 a 32), entretanto a diferença seria maior se não faltassem a ele alguns votos nos quais confiava cegamente.
O ex-vereador, ex-prefeito de Campo Grande e ex-deputado estadual, uma das figuras de destaque da Família Trad na vida pública, não votou em Pacheco, candidato de seu partido. Associou-se à candidatura de Rogério Marinho e ao projeto que representa no Congresso Nacional, que é manter viva a presença política do ex-presidente Jair Bolsonaro e acesa a chama do bolsonarismo no cenário.
Eleito várias vezes pelo regime que desde o segundo turno da disputa presidencial, Nelsinho alimenta o extremismo que, ancorado nos delírios de Bolsonaro, tenta incendiar a democracia, vandalizando os poderes e a República, querendo artificializar um contexto favorável ao golpe de estado, nada mais que uma intervenção militar aos moldes daquela que instalou a ditadura militar em 1964.
O caminho político das traições é percorrido há algum tempo e tinha, até à disputa congressual, um episódio dos mais marcantes. Foi nas eleições recentes, na sucessão estadual de 2022. Nelsinho Trad não deu as caras na campanha de seu irmão, o ex-prefeito Marquinhos Trad (PSD), que estava concorrendo ao governo de Mato Grosso do Sul.
O apoio do senador e de seus liderados foi dado a um concorrente do irmão, mas toda a população que acompanhou a disputa notou a estranha ausência de Nelsinho Trad no palanque, nas caminhadas, na propaganda eleitoral e nas agendas de maior alcance do próprio irmão. Ele não viu e não valorizou o apelo sanguíneo, o peso histórico do sobrenome e os esforços de outros familiares — como outro irmão, o deputado federal Fábio Trad, e o sobrinho, o vereador Otávio — que ficaram com Marquinhos nos bons e nos maus momentos da fracassada tentativa de vencer o embate sucessório.
O antigo ditado tomou corpo, mais uma vez: "O uso do cachimbo deixa a boca torta". Nelsinho Trad é médico, dos bons. Quem sabe ainda conserte o estrago estético.