Campo Grande vive uma situação inusitada, onde se pode adaptar o texto do blogueiro Julio Severo, quando ele traça um paralelo entre a violência do Velho Oeste e do Rio de Janeiro e demonstra que o caubói, ao menos, tinha como se defender. “Entre o Velho Oeste e Campo Grande, eu preferiria o Velho Oeste. Lá pelo menos eu poderia me defender. Contudo, o Velho Oeste não era como Campo Grande, de modo que os caubóis diriam: Ainda bem que não estamos em Campo Grande! Por amor à justiça e aos inocentes, eu diria: Que pena que Campo Grande não é como o Velho Oeste!”
Porque a criatura suplantou e devorou o mestre, mas usando da veia cômica do brasileiro, “o tiro saiu pela culatra”, e o aprendiz de feiticeiro perdeu a mão da poção mágica e o feitiço derrotou o próprio feiticeiro.
Tudo deu errado, apenas isso. Deu errada a gestão de Alcides Bernal, que acertou por não se permitir a fazer acordos, e errou porque não se permitiu fazer acordos. Sem acordo, um secretariado fraco e confuso e uma oposição forte e determinada. Ingredientes que levam ao inferno as melhores intenções dos anjos.
Tudo deu errado quando as forças que derrotaram o prefeito eleito pretenderam voltar ao comando dos negócios municipais, loteando os cargos conforme acertado. Partiram do princípio de que o escolhido ficaria com a sua parte, suficiente para saldar estranhas dívidas, mais alguma coisa para reforçar o caixa, e se disporia a ser apenas a fachada. Não foi.
A revolta do boneco do ventríloquo
De súbito, o boneco do ventríloquo descobriu que era a atração do show. No caso em questão, Olarte descobriu-se (parafraseando ex-ministro Magri) imexível. A Câmara, ainda que não discuta aqui suas razões, saiu do episódio da cassação com sua imagem arranhada e não poderia, sob o risco de perder sua credibilidade, deixar de oferecer apoio quase incondicional ao novo prefeito.
A desculpa da legitimidade do vice, não cabe exatamente para quem sabe, e o vereador sabe bem disso, que o eleitor vota em nomes, não em partidos, não no que reza a regra eleitoral. E ninguém votou em Olarte. Sequer o conheciam. O prefeito empossado era a legalidade do ilegítimo.
Nesse circo dos horrores que se fez a política campo-grandense, mentores e atores ficaram atrelados à criatura. Restava o Judiciário. Restava. Era ele que teria que legitimar um prefeito que assumia sob os holofotes da desconfiança jurídica. Investigado, pilhado em gravações telefônicas negociando tudo e um pouco mais, tornando o Velho Centro-Oeste uma terra de ninguém.
Montou-se um secretariado que beneficiou pessoas ligadas à pessoas. Nessa tentativa de organizar o caos, Olarte se tornou a primeira peça de um castelo de cartas. Caso fosse, ao menos abalado, traria abaixo todo um baralho de reis e valetes.
O prefeito aposta no caos. Zomba das Leis. Se a Justiça tem gravações, ele também as tem. Se outras pessoas estão envolvidas, ele conhece suas almas. Olarte no banco dos réus é uma arma de exterminação política em massa.
Talvez por isso não seja obrigado sequer a responder a requerimentos de um poder independente, o legislativo municipal, até porque esses requerimentos não são aprovados. Talvez por isso continue superlotando as secretarias de convocados sem explicar para fazer o quê, se o município não tem caixa para fazer nada.
E quanto às investigações e o processo montado? Simples assim: O Conselho Superior do Ministério Público do Estado de Mato Grosso do Sul em reunião realizada no dia 17 de março de 2015, determinou a devolução dos autos à Promotoria de Justiça de origem, para diligências complementares que melhor definam o caso, conforme publicado no Diário Oficial do Ministério Público de 26 de março.
O processo deve apurar eventual irregularidade no fato de dois homens tentarem extorquir, em nome do Prefeito de Campo Grande, Gilmar Antunes Olarte, empresários que prestam serviços ao Município.
O Conselho, por maioria, determinou tão somente a devolução dos autos à Promotoria de Justiça de origem, para diligências complementares.
“Considerando que os fatos não restaram devidamente esclarecidos, bem como que não foram, salvo melhor juízo, realizadas as diligências necessárias à condução de uma conclusão mais precisa, os autos devem retornar à Promotoria de Justiça para que sejam efetivados os atos necessários ao melhor deslinde do caso.”
Gilmar Olarte, é réu em processo que tramita na Seção Criminal do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul, acusado de ter cometido o crime de corrupção passiva seis vezes – em continuidade delitiva – e ainda responde por lavagem de dinheiro. As acusações do Ministério Público Estadual estão ligadas à prática de agiotagem.
Silencioso retorno
O processo retornou ao Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul (TJMS) e está nas mãos do desembargador Cláudio Bonassini, o terceiro a pegar o processo. Os desembargadores Maria Isabel Rocha e Francisco Gerardo já haviam apreciado os autos, mas se declararam impedidos por terem envolvimento com pessoas citadas na investigação.
Também devem se declarar impedidos os desembargadores Paschoal Carmello Leandro e Sideni Soncini Pimentel, ambos têm filhos na administração de Gilmar Olarte, respectivamente Fábio Castro Leandro, procurador-geral Rodrigo Pimentel, secretário de governo.
Jogo difícil de ver
Nesse campo político, o impedimento dos outros vai fazer Olarte ganhar o jogo. O problema é que para muitos, não haverá prorrogação de mandatos e nem o retorno dos que foram substituídos.