Se Donald Trump vencer as eleições americanas na votação principal agendada para amanhã, ele poderá agradecer a Elon Musk. No último mês, Musk, o homem mais rico do mundo, apoiou a campanha republicana com tanto fervor que acabou fornecendo um impulso significativo, oferecendo uma ilustração sobre como a corrupção pode se manifestar nos Estados Unidos.
A situação é alarmante. Musk teria prometido uma doação de pelo menos 500 milhões de dólares à campanha em troca de um cargo influente em um possível governo Trump, conforme afirma o próprio candidato. Além disso, organizou jantares para persuadir outros bilionários a contribuírem “em grandes números”, apresentando isso como um investimento seguro. Ele criou um Super PAC, denominado America Pac, com um orçamento de 180 milhões de dólares, que não só financia 2.500 pessoas para fazer campanha porta a porta, mas também contrata advogados para batalhas judiciais que podem beneficiar Trump.
No X, Musk elogiou Trump, usou sua influência para espalhar teorias da conspiração de extrema direita e criticou a candidata democrata Kamala Harris. Ele ressuscitou um perfil inativo, @America, para promover sua campanha e até utilizou sua conta, que possui 200 milhões de seguidores, para uma entrevista com Trump, na qual ambos riram da demissão de trabalhadores em greve — um assunto delicado, já que a Tesla é a única grande montadora que não permite a sindicalização de seus empregados.
Os tweets de Musk, amplificados pelo algoritmo da plataforma que ele adquiriu, contribuíram para uma dinâmica de propaganda que se afastou de sua proposta original. Apesar de se apresentar como defensor da liberdade de expressão, o Twitter suspendeu a conta de um repórter que divulgou informações confidenciais sobre a campanha republicana e proibiu links para a postagem original no Substack.
Além disso, Musk se comprometeu a distribuir 1 milhão de dólares por dia para eleitores de estados-chave que apoiarem uma petição em defesa da Constituição, uma estratégia que, embora não é ilegal, levanta sérias questões éticas sobre o financiamento das campanhas eleitorais.
Em entrevista ao jornalista Tucker Carlson, Musk expressou preocupação sobre as possíveis consequências legais de uma derrota de Trump, indagando sobre sua possível sentença de prisão.
O nível de envolvimento de um bilionário em uma campanha como essa é inédito na história recente dos Estados Unidos. Trata-se de um caso extremo de compra de um cargo público por interesses privados.
Se imaginarmos que um magnata das comunicações brasileiro, como Roberto Marinho, tivesse atuado da mesma forma, seria um escândalo de proporções imensas, gerando inúmeras críticas sobre a corrupção endêmica no Brasil. Contudo, a corrupção nos EUA é insidiosa porque é, em grande parte, legalizada. Empresas e indivíduos como Musk são frequentemente celebrados como visionários que impulsionam a economia, conseguindo moldar leis que permitem a compra de influências políticas.
Os Super PACs são um exemplo dessa normalização, que transforma o financiamento político em uma prática aceita, enquanto práticas como caixa dois — que levaram a investigações significativas no Brasil —são vistas com complacência nos Estados Unidos.
Quando empresas como Odebrecht financiaram campanhas políticas em outros países, a intenção era clara: garantir vantagens comerciais. A situação atual nos Estados Unidos reflete uma dinâmica similar, onde interesses corporativos se entrelaçam com o poder político.
Musk representa uma nova oligarquia digital que se comporta como os tradicionais plutocratas. O seu envolvimento na política não é apenas uma busca por poder, mas uma tentativa de evitar qualquer forma de regulamentação que poderia impactar negativamente seus negócios.
Se Trump vencer, a possibilidade de que Musk e seus aliados implementem suas agendas em um governo é real. Os interesses de Musk vão além de um simples cargo no governo; ele busca evitar regulamentações que poderiam afetar suas empresas e ampliar os subsídios governamentais que já recebe.
A relação entre a nova elite tecnológica e o governo de Trump pode ter implicações significativas para a legislação sobre inteligência artificial e práticas ambientais, entre outros temas.
Por fim, o panorama atual sugere que a tecno-oligarquia está se consolidando e, caso Trump saia vitorioso, será um desafio para o resto do mundo lidar com as repercussões dessa aliança. A luta para estabelecer um controle adequado sobre essas influências corporativas será um dos maiores desafios que a sociedade enfrentará. Estamos prestes a descobrir como essa história se desenrolará.
FONTE: Natalia Viana, Diretora Executiva da Agência Pública.