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18 de outubro de 2024
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EXTREMISTA DE DIREITA

Juristas analisam crimes de Bolsonaro no caso do hacker Walter Delgatti

Recuo de Mauro Cid na confissão pode não 'livar' o ex-presidente

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O depoimento do hacker Walter Delgatti Neto, conhecido como o hacker da Vaza Jato, à Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) na 3ª (15.ago), que investiga os atos de 8 de Janeiro, pode levar a prisão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Como mostramos aqui no MS Notícias, Delgatti revelou aos deputados que Bolsonaro queria que ele invadisse as urnas eletrônicas, simulasse fraude eleitoral e assumisse um grampo ilegal contra ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes. Em troca, Bolsonaro daria ao hacker o chamado indulto presidencial, que livra um criminoso de seus crimes. Bolsonaro já usou o mecanismo para beneficiar o extremista de direita Daniel Silveira, que hoje está preso por ataques à democracia

Matheus Falivene. 

Para Matheus Falivene, doutor em Direito Penal pela USP, a oferta da graça indulto individual — para o hacker, por ser uma prerrogativa constitucional, não configuraria ilícito penal. Entretando, todo o resto é crime semelhante ao cometido por Silveira: “A questão criminal toda gira em torno dele ter, supostamente, confabulado com para violação do sistema eleitoral, o que, dependendo da apuração, pode configurar crime contra o Estado Democrático de Direito”, disse Falivene.

Antes de se reunir com Bolsonaro, Delgatti, chamado pelo extremistas de direita de 'o Vermelho', recebeu R$ 40 mil da deputada bolsonaristaCarla Zambelli (PL). Ela o pagou para invadir os sistemas do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em julho de 2023, quando foi preso preventivamente na Operação 3FA, e implicou a deputada e o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).

Em depoimento à CPMI na 3ª (15.ago), Delgatti voltou a dizer que a invasão ao CNJ foi negociada com Zambelli. O hacker depôs à PF nesta 6ª feira (18.ago), ocasião em que entregou um áudio da assessora de Zambelli. Segundo o advogado de Delgatti, Ariovaldo Moreira, na mensagem de voz, enviada por WhatsApp, a assessora trata do pagamento para que o hacker invadisse o sistema do CNJ.

“Ele [Delgatti] apresentou ao delegado que preside a investigação um áudio onde esta pessoa, assessora da Zambelli, faz promessa de pagamento”, contou Moreira a jornalistas após a conclusão do novo depoimento de Delgatti à PF.

Zambelli teria 'testado' os serviços do hacker com essa medida para depois levá-lo para uma reunião com Bolsonaro, local onde foi questinado se dava para invadir as urnas e plantar um código fonte fraudulento, para então o candidato ter como questionar a segurança das urnas. O hacker disse na ocasião que a medida não era possível.  

Rafael Paiva. Foto: ReproduçãoRafael Paiva. Foto: Reprodução

Ainda assim, todos os envolvidos podem responder por diversos crimes. O professor de Direito Penal e Processo Penal, Rafael Paiva, disse que se confirmado que agiu como mandante mentor intelectual Bolsonaro responderá pelos mesmos crimes do hacker na qualidade de coautor ou participe. “Eles devem responder pelos crimes de tentativa de golpe de estado (359-m do código penal), escuta ilegal (Art. 10 da Lei 9.296), autoacusação falsa (341, do código penal) e incitação ao crime (286, do código penal), regente à promessa de indulto”, entende Paiva.

Segundo Delgatti, o seu 1º encontro com o então presidente durou cerca de 1h30, no Palácio da Alvorada. Na reunião, Bolsonaro também pediu que o hacker conversasse com técnicos do Ministério da Defesa sobre as urnas eletrônicas. Ele disse ter ido 5 vezes ao ministério por “ordem” do ex-chefe do Executivo, que teria escalado militares para mediar as visitas ao órgão.

De acordo com Delgatti, o então presidente também pediu, por telefone, que ele assumisse a autoria de um grampo contra o ministro Alexandre de Moraes, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). 

 

A especialista em investigação de crimes digitais, Thaís Molina Pinheiro, explica que boa parte dos sistemas de alta segurança possuem controles específicos para rastrear o acesso e a edição de dados. “A não ser que o hacker tenha um conhecimento extremamente aprofundado e específico no sistema invadido, dificilmente fará alterações sem que estas sejam identificadas”, diz Thaís.

Thaís Molina Pinheiro

No sistema eleitoral, a questão é mais complicada. A invasão às urnas é especialmente difícil, pois elas não ficam conectadas à internet, o que inviabiliza os ataques, explica a advogada. “A única porta de entrada seria a invasão ao código fonte antes de ser atualizado nas urnas, mas dada a segurança do sistema eleitoral, isso dificilmente passaria desapercebido”.

A temperatura, que já havia subido, deu uma leve arrefecida com a desistência de Mauro Cid confessar que a venda das joias foi a mando de Bolsonaro e que ele seria o beneficiário, segundo seu advogado.

No âmbito das investigações do esquema de venda das joias, o ministro Alexandre de Moraes autorizou a quebra dos sigilos bancário e fiscal do ex-presidente e da ex-primeira-dama, feito pela Polícia Federal (PF). Além do casal, foi autorizada a quebra de sigilo de Mauro Cid e do general da reserva Mauro César Lourena Cid, pai de Mauro Cid.

Fontes:

  1. Thaís Molina Pinheiro, especialista em Direito Penal e Direito Digital, é pós-graduada em Processo Penal pela Universidade de Coimbra.
  2. Matheus Falivene, doutor e mestre em Direito Penal pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP).
  3. Rafael Paiva, criminalista, pós-graduado e mestre em Direito e professor de Direito Penal e Processo Penal.