06 de setembro de 2024
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Brasil é condenado por tortura e morte do jornalista Vladimir Herzog

Comunicador foi assassinado pelos criminosos do DOI-CODI, anistidados pelo Brasil; país publicou a íntegra da sentença de culpa

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O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania publicou, nesta 5ª feira (5.out.23), a sentença condenatória da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) que responsabilizou o Estado brasileiro pela detenção, tortura e assassinato do jornalista Vladimir Herzog em 1975.

Em nota, o Ministério respondeu à medidas determinadas pela CIDH está a publicação da decisão internacional no Diário Oficial da União de 29 de setembro, um mês antes de a morte do jornalista conhecido como Vlado completar 48 anos.

Vlado foi assassinado numa cela do Departamento de Operações de Informação - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI), do Exército Brasileiro, que assolava o país com a destrutiva Ditadura Militar (1964-1985). 

A CIDH também condenou o Brasil pela falta de investigação, julgamento e punição dos responsáveis pela morte de Herzog, e pela aplicação da Lei de Anistia ( 6.683/1979) no caso.

O Tribunal recomendou ao Estado realizar uma investigação judicial completa e imparcial dos fatos e publicar os resultados dessa investigação.

O Instituto Vladimir Herzog celebra o legado de Vlado, que era jornalista, professor de telejornalismo e naturalizado brasileiro. Ele foi preso e nunca mais foi visto com vida após negar ligações com o Partido Comunista Brasileiro.

A foto de Herzog morto na cela foi divulgada, mas a veracidade foi questionada.

A família de Herzog recebeu uma segunda certidão de óbito em 2013, que substituiu formalmente a versão da ditadura militar sobre sua morte.

Vladimir Herzog

Vlado Herzog nasceu em 1937, em Osijek, antiga Iugoslávia, atual Croácia. Ele se naturalizou brasileiro e iniciou a carreira de jornalista em 1959. Em 1975, Vladimir Herzog dirigia o jornalismo da TV Cultura, depois de ter passado pelas redações do jornal O Estado de S. Paulo, da revista Visão; e da BBC, em Londres (UK). Herzog ainda foi professor de telejornalismo na Fundação Armando Álvares Penteado (FAAP) e na Escola de Comunicações e Artes da USP (ECA-USP).

De acordo com Instituto Vladimir Herzog (IVH), organização da sociedade civil criada em 2009 para celebrar o legado de Herzog, agentes do Exército convocaram Vlado, em 24 de outubro de 1975, para prestar depoimento sobre supostas ligações dele com o Partido Comunista Brasileiro (PCB).

No dia seguinte, Vlado compareceu espontaneamente ao prédio do DOI-CODI, no bairro do Paraíso, em São Paulo. No local, foi preso com mais dois jornalistas: George Duque Estrada e Rodolfo Konder.

Em depoimento, Vlado teria negado qualquer relação com o PCB. Os outros dois jornalistas, que estavam no mesmo prédio do Exército, testemunham que ao serem levados para um corredor, escutaram a ordem para que trouxessem a máquina de choques elétricos.

Vladimir Herzog nunca mais foi visto com vida. A versão oficial do Estado brasileiro à época, apresentada pelos militares, foi a de que o preso teria se enforcado com um cinto, nas grades de uma das celas do DOI-CODI.

Uma foto do jornalista morto na cela, de autoria do fotógrafo Silvaldo Leung Vieira, foi divulgada e a veracidade da imagem foi questionada pela sociedade, desde então. Em depoimento à Comissão da Verdade do Estado de São Paulo - Rubens Paiva, da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, em 2013, o fotógrafo disse aos vereadores que era estudante de um curso de fotografia da Polícia Civil e não se sentiu cúmplice da mentira contada pelos militares. Ele também disse ter percebido a farsa, no cenário que teria sido montado para o registro fotográfico. A família de Herzog discordou da versão de não cumplicidade apresentada por Silvaldo.

Em 2016, na representação feita à Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), os familiares do jornalista assassinado  apontaram a violação de direitos, em razão da falsa versão de suicídio e da ocultação de informação sobre este caso.

Em março de 2013, em uma audiência da Comissão Nacional da Verdade, em São Paulo, a família de Vladimir Herzog recebeu, uma segunda certidão de óbito do jornalista. No novo documento, passou a constar como causa da morte de Herzog "lesões e maus tratos", o que substituiu, formalmente, a versão de "asfixia mecânica", divulgada pela ditadura militar à época.