A manifestação que levou aproximadamente 100 mil pessoas para a Avenida Afonso Pena, em Campo Grande, não pode ser entendida assim, no singular. Foram manifestações de múltiplos desejos. Desde os solitários que pretendem o retorno do governo militar – ainda que isso implique e indique um retorno à Ditadura, a grande tutora dos desacertos que geraram uma democracia que mal anda, porque teve pernas atrofiadas – até manifestações classistas (ou de categorias) que pedem respeito àqueles estudantes e suas famílias que confiaram no FIES, operadores de direito exaltando a honra aposta à categoria pela coragem de Sérgio Moro, ou cobrando coerência ética do ministro Dias Toffoli etc. (que deveria permitir o plural para acentuar a ideia).
Talvez a melhor definição para as manifestações tenha sido dado nas redes sociais pelo vocalista da banda Capital Inicial, Dinho Ouro Preto, ele vindo de uma linhagem de políticos: “Não sou tucano, nem petista. Não votei em nenhum dos dois e acho que a Dilma está fazendo um péssimo governo. Temos inflação, recessão e corrupção. Fora isso eu a acho arrogante, teimosa e limitada, características que vão acabar comprometendo tudo de positivo que foi construído durante os anos do Lula e do FHC. Contudo, me oponho ao impeachment, a menos que apareça algo bombástico que a ligue diretamente a algum desvio, sou a favor da continuidade. Nossa democracia foi conquistada com muito sacrifício, e eu dou um valor imenso a ela. Dito isso, preciso dizer que as manifestações têm meu apoio. Acho legítimo e louvável o povo ir às ruas contra um governo medíocre. No entanto, golpe, nem pensar. Viva a democracia e a liberdade.”
Entre as diversas faixas carregadas pelos manifestantes, retalhos que compõem uma imensa colcha de unidade e pluriformidade.
“Fora Dilma / Você não governa mais esse país”
“A energia do Brasil esgotou”
“A culpa não é minha / eu votei no Aécio”
“Obrigado Sérgio Moro / o Brasil agradece!!!”
“Ministros honrem o seu trabalho / Pizza jamais / Fora Dias Toffoli”
“12 anos de cabresto eleitoral / Fora Esquerda Caviar”
Não eram só as faixas, mas a presença de representantes dos produtores rurais, a cavalo, acompanhando as manifestações; clubes de motoqueiros, maçons uniformizados, crianças, jovens, adultos, idosos...
O produtor rural Frederico Paniago, um dos que participaram em cavalos, foi enfático: “Esse movimento tende a crescer, precisa crescer, Nós estamos a cavalo nessa manifestação representando toda a classe de produtores rurais, muitos dos quais caminhando nessa manifestação. Chega de corrupção, chega de descaso com a classe produtora desse país que sofre com o corte dos subsídios, os juros abusivos, as invasões de terras. Acredito que alguma coisa vai mudar, porque a população veio para a rua, e a coisa que o político mais teme é o povo nas ruas exigindo seus direitos.”
Com um cansaço físico que não lhe apagava o sorriso do rosto, o advogado e maçom Danny Fabrício Cabral Gomes, definiu o motivo de haver cumprido todo o trajeto: “A maçonaria não vai se furtar de participar das manifestações que, em síntese, pedem igualdade, liberdade e fraternidade, o lema defendido por nós. Acreditamos que estas manifestações ocorridas por todo o país irão motivar uma profunda reflexão por parte dos políticos. É o povo dando um basta na impunidade.”
Muitos dos que participavam eram “aspones”, que nada mais é que uma forma menos rentável de corrupção, quase todos já compraram produtos contrabandeados, muitos têm windows ou offices pirateados em seus computadores, outros tantos querem o retorno de seus partidos aos cargos de poder para, de alguma forma, se locupletarem, uma parcela fornece produtos e/ou serviços para os governos e pagam “comissões” para isso, mas a esmagadora maioria quer um país mais justo, outros desejam, de absoluta consciência, um país mais justo e equânime que lhes permita sair dessa semiclandestinidade, apagar esses segredos de seus currículos.
Fiasco
Venceu o “não”. Não aceitamos. A marcha desse 15 de março mostrou o fiasco de um grupo que se apossou do poder tramando o que há de mais sórdido no jogo político: a compra de consciência sob a ameaça da fome.
O grande fiasco da manifestação da sexta-feira 13, não foi a cabal demonstração dos excluídos, que não têm uma ocupação em pleno dia útil porque se permitem manobrar por um governo que não avançou na reforma agrária, mas o mantém sob tutela e cabresto.
A consolidação do fiasco foi terem arquitetado uma manifestação contando que começaria pequena e se avolumaria com a adesão dos funcionários do comércio e transeuntes, desarvorados com o cada vez mais minguado valor de seus rendimentos corroídos pela inflação que a candidata Dilma afirmava não haver. Se o Rei já estava nu, agora foi a vez dos plebeus.
Num esforço insano de seguir de desmontar a verdade para vendê-la como mentira, em busca de um fim que justifique os meios, um dos exaltados defensores do atual governo publicou na sua página do Facebook, mesmo no momento em que quase 50 mil pessoas tomavam as ruas da Capital, fotos de horas antes da estipulada para o início das manifestações garantindo: “E a TV Engrossando a Mentira da GLOBO a manifestação em Campo Grande não passou de 500 pessoas isto por que alguns deputados vereadores e o Golpista pastor Mandou seus comissionados engrossar a Fila!!!”
Desobediência Civil
A Manifestação que pretende se repetir em 12 de abril, caso ações efetivas não sejam tomadas, pode ser o pontapé para a Desobediência Civil, que é uma maneira de protestar contra um governo opressor. O conceito é de 1849 e foi desenvolvido por Henry David Thoreau, que dizia não ser preciso lutar fisicamente contra um governo caracterizado pelo autoritarismo, seria suficiente e efetivo que a população não apoiasse o sistema e que também não permitisse que o governo apoiasse os movimentos populacionais.
O conceito serviu de tática na luta, o caso mais emblemático se deu com as ações lideradas por Mahatma Gandhi, mais tarde por Martin Luther King.
Juridicamente, Desobediência Civil é considerada uma forma de expressão do Direito de Resistência que possui cunho jurídico, mas não precisa de leis para garantia. A Desobediência Civil está no mesmo patamar jurídico do Direito de Greve e do Direito de Revolução, o qual se refere ao direito do povo de resguardar sua soberania quando é ofendida.
Ou seria a solução salvadora?