ais uma tentativa malsucedida de me aposentarem.” Dessa forma bem-humorada Washington Olivetto, 62 anos e na ativa desde os 18, um dos maiores publicitários do mundo, define sua entrada para o Hall da Fama do The One Club Creative. O “adequador de linguagem” que conquistou nos anos 70 o primeiro Leão de Ouro para a publicidade brasileira (equivalente ao Oscar do cinema) é agora o primeiro não anglo-saxão a integrar um time com outros grandes que dão nome a agências internacionais, como Leo Burnett e David Ogilvy, e até Steve Jobs, o fundador da Apple.
Nos últimos seis meses, é a segunda celebração da história de Washington na publicidade mundial. Em outubro, ele recebeu o Clio Lifetime Achievement, também em Nova York – cidade pela qual tem paixão, como todo andarilho de bom gosto.
O encontro com esse homem de inteligência rara e conversa generosa se deu alguns dias antes da recepção black tie para a qual ele comprou, em Londres, uma camisa de sua grife favorita, a Comme des Garçons, durante as férias com a mulher, Patrícia, e os filhos de 10 anos, Theo e Antonia. Na sede paulistana de sua W/McCann, terceira maior agência do Brasil, Washington fala sobre suas paixões: a família, o trabalho, as viagens, a gastronomia, o Corinthians, as artes, a cultura pop... a vida, na verdade. Truque que lhe garante a eterna juventude.
QUEM: Você ganhou os maiores prêmios da publicidade, e costuma ser o primeiro brasileiro em cada conquista. Continua sendo emocionante?
Washington Olivetto: Amadureci rapidamente sob o ponto de vista da vaidade e da emoção porque tive a sorte de fazer sucesso muito garoto, então fiquei bobo na idade certa. Sou grato aos prêmios, eles me deram uma visibilidade que ajuda a conquistar clientes, que é o fundamental. Sob a ótica da emoção, o Hall of Fame tem para mim o mesmo significado do primeiro Leão de Ouro em Cannes, ou do primeiro Profissionais do Ano da Rede Globo, momentos muito grandes. Por quê? Porque sou o primeiro não anglo-saxão, um dos mais novos, um dos poucos que entraram ainda na ativa. Tudo isso mexe com a autoestima. E tudo isso é resultado de duas coisas: de eu ter começado quando a geração anterior já tinha profissionalizado a propaganda, e porque sempre tive gente maravilhosa trabalhando ao meu lado. Consegui disseminar nas minhas equipes o entendimento de que é melhor ser coautor de muita coisa brilhante do que autor solitário de algo medíocre. Todos os prêmios que ganhei, mesmo as consagrações individuais, têm coautores.
QUEM: Como inspira suas equipes?
WO: A função de um bom diretor de criação é saber julgar a ponto de simplesmente parabenizar e não atrapalhar quando estiver muito bom; saber melhorar e ajudar a melhorar quando for necessário, mas jamais reivindicar a autoria disso; e saber fazer uma mágica de vez em quando pro pessoal te olhar e dizer assim: “Puxa, trabalho com esse cara! (risos)”.
QUEM: Essa mágica tem disciplina por trás?
WO: Total. Se tenho alguma qualidade – e devo ter umas duas – uma delas é uma enorme disciplina. Todo mundo nasce pra fazer algo bem- feito, mas poucos têm a sorte de descobrir o quê. Eu descobri muito garoto. Depois você tem que adestrar seu talento. Até porque para ser um bom publicitário não precisa de tanto talento, mas esse talento precisa estar bem adestrado. Minha outra qualidade é que tenho a intuição de uma comissão de mulheres. Minha intuição é um perigo (risos)!
QUEM: Para tudo?
WO: Para tudo! O que quebra um galhão! Na verdade, tudo meu é misturado, nunca estou só trabalhando ou me divertindo. Estou sempre trabalhando e me divertindo, me divertindo e trabalhando. Acho que ninguém vai se dar ao luxo de dizer que não tem nenhum preconceito intelectual, mas sou das pessoas que pode dizer que tem o menor preconceito intelectual. Vou de Theodor Adorno (intelectual alemão) a Valesca Popozuda com o mesmo prazer e a mesma curiosidade.
QUEM: Você sempre foi assim?
WO: Sempre. Acho que trabalho com isso porque sou assim. Sou um adequador de linguagem: um dia falo com a dona de casa, no outro com o caminhoneiro. Se eu não conhecer essas linguagens vou errar. E o que me realimenta é a vida. Todas as coisas que faço que não são publicidade, tipo escrever um livro sobre gastronomia ou futebol, são coisas para eu me realimentar para fazer melhor publicidade. Me realimentar com a vida sempre foi meu grande truque.
QUEM: Você teve filhos em idades distintas: na faixa dos 20 teve Homero, que é cineasta, fruto de seu primeiro casamento, e na faixa dos 50 teve os gêmeos. Como compara as duas experiências?
WO: Acho que consegui ser sempre um pai participativo. Sou ruim de recém-nascido, sou ruim de pegar, tenho medo, acho que vai quebrar... Mas sou muito bom com criança depois que ela começa a se comunicar. Agora, é claro que os pequenos contam com o fato de eu ter mais experiência.
QUEM: O que já vê de você neles?
WO: As características do Homero são muito ligadas à criação que ele teve, o fato de se transformar num diretor de cinema é muito por ter tido uma formação voltada para isso. Os dois pequenos têm uma participação minha e da Patrícia quase obsessiva. A Patrícia optou por ter filhos aos 40 anos, depois de ter toda a realização profissional possível como sócia da Conspiração, a produtora. Ela vendeu a parte dela para os sócios para se dedicar às crianças. Só agora ela voltou a trabalhar e numa atividade, a de art dealer, na qual tem tempo de se dedicar a eles. Já vejo neles uma preocupação com o vocabulário, que tanto eu como a Patrícia sempre tivemos. Eles já falam inglês e francês relativamente bem, e espero que passem a falar tão bem todas as línguas quanto a mãe e não quanto o pai, porque sou um poliglota analfabeto... Falo perfeitamente mal muitas línguas! Tudo eu aprendi fazendo. A Patrícia é estudiosa, ela só passa a falar quando fala perfeito. Já eu passei a fazer palestra em outras línguas e assim é que fui aprendendo!
QUEM: O que faz seus olhos brilharem? E o que te dá preguiça?
WO: Grandes ideias fazem meus olhos brilharem. E não suporto burrice e deslealdade. Convivo realmente mal com o raciocínio burro e desleal e o que é pior: tenho dificuldade para esconder. Até porque eu sou uma matilha de cães na categoria lealdade.
QUEM: Quais são seus luxos?
WO: Poder viajar sempre que eu quiser, pra onde eu quiser, por exemplo, para ver meu Corinthians jogar em Tóquio; poder cuidar bem das pessoas; poder viver numa casa que tem muitas artes plásticas. Eu e Patrícia, desde que nos casamos, nos presenteamos com arte. E o maior prazer da pequena coleção que a gente possui é que muito do que temos agora não poderíamos mais comprar. São coisas de artistas que quando adquirimos estavam começando, nacionais e internacionais. Isso é muito prazeroso e tem a ver com o treino do olhar, algo que tenho conseguido colocar na criação dos meus filhos: treinar o olhar deles. Também gosto de comer bem e de beber bem.
QUEM: Como você se mantém jovem?
WO: Acho que é minha busca de não ter preconceito com a informação. E o fato de que me realimento e realimento a minha turma com o novo, com o que é primeira mão. Algum tempo atrás um querido amigo que é presidente da Warner me disse: “Ouça essa menina, vou lançá-la”. E ali na minha sala de audiovisual, que criei para vermos os trabalhos com qualidade, a Anitta foi ouvida pela primeira vez numa agência de publicidade.