Representantes de movimentos internacionais e nacionais em apoio às lutas por justiça social nas áreas de monocultivo de árvores se reuniram com pesquisadores universitários, para debater a expansão de plantações do eucalipto transgênico voltadas à produção de celulose na região do Bolsão, leste de Mato Grosso do Sul. O encontro ocorreu neste mês de junho, na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), campus de Três Lagoas.
De acordo com os especialistas, o cultivo de árvores transgênicas traz riscos e danos preocupantes aos pequenos agricultores, comunidades indígenas e tradicionais diretamente afetadas pelo uso intenso de agrotóxicos nas plantações de eucaliptos, prática capaz de inviabilizar cultivos tradicionais, além de comprometer o desenvolvimento de formas de vida existentes nas áreas de vegetação nativa, sobretudo no bioma Cerrado.
Os ambientalistas vieram dos Estados Unidos, Argentina, Nova Zelândia, Canadá e Irlanda e se juntaram a representantes do Ministério Público do Trabalho, lideranças indígenas, diretores, professores e alunos de universidades públicas, em um amplo canal de diálogo com o objetivo de identificar espaços para proteger os grupos de resistência ao cultivo de árvores transgênicas.
Durante a reunião, alguns participantes e pesquisadores expuseram suas experiências em pesquisa nas comunidades rurais e os impactos negativos das plantações com modificação genética na pequena agricultura. Segundo eles, a Argentina vivencia situações semelhantes à expansão do cultivo de eucalipto transgênico observada em Mato Grosso do Sul, estado onde esse movimento também alcança outras espécies vegetais, como o trigo e a erva-mate, sendo fortemente impulsionado pela política desenvolvimentista.
“Mato Grosso do Sul é o estado com maior expansão de eucalipto, principalmente em razão dos incentivos fiscais ofertados às papeleiras e da disponibilidade de terras anteriormente ocupadas pela pecuária. Em vastas áreas, a vegetação nativa está sendo retirada para o plantio de eucalipto transgênico com prejuízos para a fauna e flora. Moradores de comunidades rurais relataram a migração de animais silvestres para as suas moradias, em busca de alimentos”, esclareceu o procurador do Trabalho Leomar Daroncho, presente à reunião.
Ainda segundo o representante do Ministério Público do Trabalho, no cultivo do eucalipto transgênico também ganham relevo os mitos da indústria química para a aceitação dos grandes volumes de agrotóxicos, justamente quando o mundo está mais alinhado com a agenda da agroecologia. “São crenças de que o equipamento de proteção individual seria suficiente e de que não seria possível produzir as árvores sem os produtos químicos”, observou Daroncho.
Outra preocupação, citada pelo procurador do Trabalho, refere-se à aplicação do produto Glifosato nas plantações de eucalipto transgênico, o qual tem restrições para altas temperatura (superiores a 28 graus celsius) e foi denunciado pela Agência Internacional de Pesquisa em Câncer por conter substâncias possivelmente cancerígenas. “Em outros locais de grande utilização da pulverização de agrotóxicos, há estudos apontando a correlação da exposição com malformações, abortos e doenças crônicas. Os agricultores e trabalhadores merecem a correção das irregularidades encontradas no campo”, acrescentou.
No encontro, o coordenador do Programa de Pós-Graduação em Geografia, na UFMS/Três Lagoas, Sedeval Nardoque, professores e seus orientandos apresentaram os mais diferentes resultados, obtidos em nível de mestrado e de doutorado, sobre os impactos do monocultivo de eucalipto na região do Bolsão. Segundo os estudos, mais de 1 milhão de hectares cercam as comunidades de pequenos agricultores e a aldeia indígena Ofayé Anodi, localizada no município de Brasilândia.
“Em um curto período, vimos a expansão do plantio de eucalipto transgênico nos arredores da aldeia Ofayé Anodi. A ganância de pessoas por dinheiro e poder trouxe destruição ao meio ambiente. Percebemos inúmeras árvores nativas, com cem ou duzentos anos, sendo derrubadas por máquinas em poucos minutos e, no local, substituídas por eucalipto transgênico. Nos últimos anos, notamos também lagos e terras cada vez mais secos, o clima cada vez mais quente e, em nosso entendimento, isso é reflexo da expansão do eucalipto. Enquanto população indígena, somos defensores da natureza e lutamos pela terra, pela preservação do meio ambiente, valorizando o nosso ecossistema e a nossa biodiversidade”, enfatizou o cacique Marcelo da Silva Lins, um dos participantes da reunião.
Em Mato Grosso do Sul, alguns grandes empreendimentos do setor de celulose e papel têm atraído a atenção de especialistas. Exemplos são a fábrica da empresa Suzano S/A, instalada no município de Três Lagoas, e uma unidade que está sendo erguida em Ribas do Rio Pardo, além de uma planta da empresa Arauco Celulose do Brasil S/A em construção no município de Inocência e da fábrica da Eldorado Celulose, também situada em Três Lagoas.
O estado de Mato Grosso do Sul e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social atuam financiando, de forma generosa, os novos empreendimentos papeleiros. Paralelo a isso, a flexibilização da legislação estadual vem permitindo a supressão de remanescentes de vegetação típica do bioma Cerrado.
Dentre as entidades ambientalistas que participaram da reunião, destacam-se a World Rainforest Movement, Global Justice Ecology Project e Canadian Biotechnology Action Network.
Fonte: Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul